Divisão dos Arquivos

O Blog Pablo Neruda Brasil está apresentado em quatro seções obedecendo à data de publicação da matéria:

Arquivo Cecilia Zokner

Os breves textos sobre a poesia de Pablo Neruda foram publicados sob a rubrica Literatura do Continente no jornal O Estado do Paraná, Curitiba e fazem parte, juntamente com outros textos versando sobre Literatura Latino-americana, do Blog http:\\www.literaturadocontinente.blogspot.com.br. Os demais, em outras publicações.

Arquivo Adriana

Chilena de Concepción, amiga desde 1964, quando convivemos em Bordeaux, ao longo dos anos me enviou livros e recortes de jornal sobre Pablo Neruda. Talvez tais recortes sejam hoje, apenas curiosos. Talvez esclareçam algo sobre o Poeta ou abram caminhos para estudos sobre a sua obra o que poderá, eventualmente, se constituir uma razão para divulgá-los.

Arquivo Delson Biondo

Doutor em Literatura na Universidade Federal do Paraná. No ano do centenário de nascimento de Pablo Neruda, convidei Delson Biondo, meu ex-aluno do curso de Letras para trabalharmos sobre “Las vidas del Poeta, as memórias de Pablo Neruda”, constituídas de dez capítulos, publicados, em espanhol, na revista O Cruzeiro Internacional, no ano de 1962. Iniciamos o nosso trabalho com a sua tradução, visando divulgar, no Brasil, esse texto do Poeta que somente anos mais tarde iria fazer parte de seu livro de memórias Confieso que he vivido. Todavia, várias razões impediram que a tradução fosse publicada no Brasil, mas continuamos a trabalhar sobre “Las vidas de Poeta” no que se referia aos aspectos formais comparativamente a esses mesmos textos que passaram a fazer parte de Confieso que he vivido. Além desse estudo comparativo, pretendíamos nos aproximar, minuciosamente de cada um dos capítulos de “Las vidas del Poeta”. A comparação foi realizada e o estudo do primeiro capítulo concluído. Estávamos já, terminando a redação do estudo do segundo capítulo quando Delson Biondo veio a falecer em maio de 2014. Assim, as notas comparativas dos textos nerudianos e o estudo do segundo capítulo de “Las vidas del Poeta” não foram concluídos. Penso que a eles nada devo acrescentar.

Arquivo Aberto

Arquivo Aberto à recepção de trabalhos escritos em português ou espanhol que tratem da obra de Pablo Neruda, obedeçam às normas da ABNT e sejam acompanhados de um breve curriculum do autor. Os trabalhos poderão ser enviados para publicação neste Blog pelo e-mail pablonerudabrasil@gmail.com.

24 de dezembro de 2006

A Guerra de Espanha nas memórias de Pablo Neruda: a fogueira

            A quinta parte das memórias de Pablo Neruda tem por título “España en el corazón” e se inicia com o testemunho sobre Federico García Lorca e Miguel Hernández. Logo, sobre a revista El Caballo Verde da qual foi diretor e cujo sexto número não foi terminado porque, no dia em que deveria aparecer, o 19 de julho de 1936, Francisco Franco se rebelara contra a República espanhola. E, novamente, a presença do poeta de Bodas de sangre, no relato do pré-conhecimento que ele havia tido de sua morte. Então, Pablo Neruda fala de España en el corazón, seu primeiro livro de poemas combatentes: creio que poucos livros, na história estranha de tantos livros, tenham tido tão curiosa gestação e destino. Publicado em novembro de 1937, em Santiago, foi traduzido em várias línguas. Um ano depois, aparecia numa edição surpreendente, impresso perto de Gerona, num velho mosteiro. Seu amigo, Manuel Altolaguirre, o mesmo que o fizera diretor de El Caballo Verde, instalou uma impressora em plena frente de batalha. Os soldados aprenderam a fazer uso dela e quando faltou papel, o fabricaram num velho moinho, utilizando não apenas algodão e trapos, mas vendas, roupas, uma bandeira inimiga e a camisa ensangüentada de um soldado mouro. Porém, apenas ficou pronto o livro, deu-se a derrota dos republicanos e milhares de espanhóis iniciaram a sua fuga para França. Entre eles, Manuel Altolaguirre e os soldados que haviam composto e impresso, em meio à ameaça de morte nas trincheiras, España en el corazón. O livro era para eles um orgulho e o carregavam para o desterro, na sofrida marcha em direção ao norte, numa longa fila, que, muitas vezes, sofria a ação de bombardeios.
            Doze anos antes do aparecimento de Confieso que he vivido, Pablo Neruda publicava na revista O CRUZEIRO Internacional, dez capítulos de suas memórias. O sétimo deles, com o título de “Tempestad en España”, se inicia com o relato da comemoração, na Espanha, dos vinte e cinco anos da insurreição contra a República: Justamente quando escrevo estas linhas, a Espanha oficial celebra vinte e cinco anos da insurreição. Um dado temporal que precisou ser alterado quando retomou os textos escritos em 1962 para o seu livro de memórias. Assim, vinte e cinco anos foi substituído pelo termo tantos que, impreciso, remete ao momento em que ocorreu a ação para um passado indeterminado, permitindo a leitura em qualquer tempo. No entanto, se tal substituição foi necessária, outras houve como, também, eliminações e acréscimos de palavras ou de expressões que se originaram dos mais diversos motivos. Na menção que faz, no texto da revista, à tropa que Franco (designado por Caudillo) passa em revista, ele diz: Estas tropas, que suponho composta por rapazes que não conheceram esta guerra.  No livro, a seqüência sofreu o acréscimo da expressão na sua maioria e a substituição dos adjetivos demonstrativos que, então, passam a indicar uma ação ocorrida mais distante no tempo: umas tropas compostas, na sua maioria, de rapazes que não conheceram aquela guerra. Mais adiante, no texto de O CRUZEIRO, se refere aos moços que desfilam diante da Guarda Moura como aqueles que ignoram talvez a história ou conhecem somente seu lado branco ou negro. No livro, a seqüência em questão, se transforma: ignoram talvez a verdade dessa história tremenda. No episódio que narra a retirada dos republicanos para a França, as modificações possuem um significado que vai além de simples preocupação estilística. Ao se referir aos inúmeros bombardeios lançados sobre os fugitivos inicia a frase com o advérbio alli e usa o verbo desgranar (debulhar): Ali caíram muitos soldados e se debulharam os livros na estrada. Outros, extenuados, enfiaram embaixo de uma pedra ou atrás de um arbusto os perigosos ramos de minha poesia. No livro, apenas: Caíram muitos soldados e se esparramavam os livros na estrada. Outros continuavam a infindável fuga. E o que na versão do livro apareceu diluído numa frase de sujeito indeterminado, como a minimizar a atuação dos franceses, Além da fronteira trataram brutalmente os espanhóis que chegaram no exílio, na revista, se mostra claro não apenas quanto ao lugar, mas quanto ao sujeito da ação: Na fronteira da França as tropas francesas trataram brutalmente os homens que chegavam ao longo exílio.
            E destino igualmente perverso teve, nas injustas mãos francesas, España en el corazón: Numa fogueira foram imolados os últimos exemplares daquele livro ardente que nasceu e morreu em plena batalha.


Cecilia Zokner in Literatura do ContinenteO Estado do Paraná, Curitiba, 24 de dezembro de 2006

17 de setembro de 2006

Todas essa mortes

            Se parece impossível que alguém possa entender a própria morte, Pablo Neruda teria, ainda, razões de sobra para não o ter conseguido: morreu no sofrimento de ver sucumbirem seus últimos sonhos na desgraça do dia 11 de setembro de 1973, em Santiago do Chile. Velado em meio ao caos de sua casa destruída, em meio à angústia daqueles que, além do sentimento de perda e de revolta, sabiam que estavam correndo sério risco simplesmente por estarem ali. Assim, não foi lembrado o que pedira: Não fechem meus olhos / mesmo depois de morto, / precisarei deles ainda para aprender, / para olhar e compreender a minha morte. Estes versos pertencem ao poema “La verdad”, do livro Memorial de Isla negra, publicado, em 1962. Como o fizera alguns anos antes, em alguns versos de Canto General, aos cinqüenta e oito anos, Pablo Neruda obedece ao impulso de escrever em verso, como o fazia em prosa para as memórias publicados pelo O CRUZEIRO Internacional,  a sua biografia.
            Memorial de Isla Negra  se divide em cinco partes (cinco volumes como as define o Poeta) e na primeira, “Donde nace la lluvia”, procura fixar, em busca do reencontro e numa evocação que o vazio das ausências torna profundamente dolorido, três figuras: a da mãe, cujo rosto se desvaneceu e lhe ficou desconhecido, roubado pela morte prematura; a da mamadre (quem o criou e nunca foi, por ele, chamada de madrasta) que, lavando, passando, semeando, costurando, cozinhando, ao vê-lo criado, partiu no pequeno esquife /  onde pela primeira vez ficou ociosa / sob a dura chuva de Temuco; e do pai, o pai brusco, ferroviário que volta do trabalho, recriminando em voz alta, sacudindo as tábuas da mesa, bebendo com os amigos. O pai, chamado José del Carmen Reyes, que um dia com mais chuva que outros dias[...] subiu no trem da morte e não voltou.
            Nestes três poemas, “Nacimiento”, “La mamadre”, “El padre”, Pablo Neruda inicia, sob a égide da morte, o fio biográfico que irá conduzir suas lembranças, também, outras vezes, encadeadas aos desígnios do inevitável. No poema “Locos amigos” fala desse vazio que ficou no lugar de Rojas Giménez, o amigo extraviado, aquele que deveria dar lições à primavera, motivo da ode que lhe dedicou, ao saber, em Barcelona, que havia morrido. Recorda a sua delicadeza, a sua ternura errante, a sua fragilidade, o que dele recebeu e esse partir inesperado como se o vinho o tivesse levado embora. Também, retorna à figura de outros amigos, Federico García Lorca e Miguel Hernández, no poema “Los muertos”. Pertence, como outros que dizem de sua experiência na Guerra Civil espanhola, ao terceiro volume, “Fuego cruel”, e expressa a grande dor que sentiu com suas morte e a indignação diante do suplício infligido a muitos outros feridos, / crucificados  / até na lembrança / com a morte espanhola.
            Dois anos depois da publicação de Memorial de Isla Negra, proferiu, na Biblioteca Nacional de Santiago, uma conferência na qual diz ter perseguido, nos versos desse livro, a expressão venturosa ou sombria de cada dia e que seu relato se dispersa e volta a se unir, acurralado por fatos de sua vida e pela natureza que o continua chamando com todas as suas inumeráveis vozes. Premissa já presente no poema “Aquellas vidas” do volume, “La luna en el labirinto”, ao confessar que não lhe era possível, somente, falar de si pois, nesse tecer Não somente conta o fio / mas o ar que escapa das redes. Então, fala dos que amam e dos que morrem de amor e do que presenciou, uma tarde, na Índia: o ritual fúnebre nas margens do rio onde foi consumido pelo fogo o corpo da mulher: e não sei se era a alma ou era a fumaça / o que do sarcófago saía / até que não restou mulher nem fogo / nem ataúde, nem cinza: já era tarde / e só a noite e água e sombra e rio  / ali permaneceram na morte. Fala de animais porque não pode esquecer aquele que foi sacrificado quando ele era menino e cujo grito ainda ressoa na distância aterradora. Fala dos peixes porque lhe persiste a lembrança dos que azuis, peixes de puro âmbar amarelo, peixes de luz violeta e pele fosfórica, no Ceilão, morriam esvaindo-se no fio da pálida faca mercenária.
            Com seus olhos de humano, não pode o Poeta enxergar depois de morto. Tampouco pode cantar, como queria, ao deixar de existir. O que viu, no entanto, e cantou, ainda que tenham sido todas essas mortes, adquiriu vida na sua expressão luminosa.

            Só a morte permaneceu calada.


Cecilia Zokner in Literatura do ContinenteO Estado do Paraná, Curitiba, 17 de setembro de 2006

9 de julho de 2006

O Indizível

            Plenos poderes foi publicado em 1962 e os trinta e seis poemas que o compõem se constituem, no dizer de Emir Rodríguez Monegal, como as outras obras que vieram à luz entre 1958 e 1964, a fecunda expressão outonal de Pablo Neruda. São pequenos poemas a cantar o mar, a água, o cardo, a primavera; outros, mais extensos, como o que historia a construção de sua casa “La Sebastiana” desde a hora em que a planeja (Primeiro a fiz no ar) até deixá-la pronta para florescer (trabalho para a primavera); houve o trivial – cimento, ferro, vidro, pregos, aldrava, fechaduras – e a emoção de salvar as portas sem muro, quebradas, / amontoadas em demolições,/ já memória,/ sem lembrança de chave. Também, os que lembram de amigos muito especiais: o músico Acario Cotapos, que, para ele, transformou o idioma num desmoronar de cristais; o velho arrumador de relógios, o antigo herói dos minutos, Asterio Alarcón. Ainda, os que parecem nada dizer num jogo feito de sons e de imagens. Como caminho a conduzi-los, um indagar de si mesmo que ora se mostra assaz tristonho, assaz alegre; por vezes, faiscante na troça que nunca é inocente. No poema “Al difunto pobre”, o tom jocoso se instala nos versos iniciais. Ao usar o possessivo de primeira pessoa do plural, acompanhando o termo pobre que será repetido, justaposto e sem pontuação, ainda duas vezes; ao usar o verbo no futuro para uma ação a ser realizada em tempo muito próximo: A nosso pobre enterraremos hoje / a nosso pobre pobre. Na segunda estrofe, ainda se servindo de um pleonasmo, entrelaça o verbo habita com o substantivo habitante na intenção de apontar para a incongruência de que esse pobre, somente passa a significar algo depois de morto. Porque vivo, nada possuiu. Nem casa, nem comida, nem alfabeto, nem lençóis. Só o trabalho duro de cavar a terra inculta, picar pedras, cortar trigo, molhar a argila, transportar a lenha. Ao morrer, Por sorte, e é estranho, se puseram de acordo /todos desde o bispo até o juiz / para lhe dizer que terá céu. Com o lírico, o cômico, o irônico, o burlesco vai se fazendo a história de vida de quem nunca esperou tanta justiça.
Sobretudo, a persistir, o eu que está presente no confessar o seu dever de poeta (oferecer o som do mar a quem não o escuta), a sua submissão diante da vida (não tenho mais remédio que viver), no dizer da amizade, das indagações que o habitam. De suas muitas certezas. Não raro, assume a voz dos homens. No poema “Los nacimientos”, o primeiro verso afirma, prosaico e inquestionável: Nunca recordaremos ter nascido. Os seguintes referem o viver – um cotidiano que pacientemente anota o transcorrer do tempo e o carinho ofertado – e, outra vez, constatam que o minuto de morrer é deixado sem menção. Como também, o momento de nascer. Agora, o Poeta se dirige a si mesmo ou a um interlocutor para dizer o que é sabido: que do momento de nascer, nada é lembrado, nem um ramo/ da primeira luz. Restando, somente, essa verdade, Sabe-se que nascemos, verso que se constitui uma estrofe para, que, na estrofe que se lhe segue, referir o momento, seja ele numa sala, num bosque, numa choça de pescador, nos canaviais em que uma mulher se dispõe a parir. Outra vez, a mesma estrofe de um verso, porém com verbo no passado, a introduzir aquela em que o Poeta registra a passagem do não ser para o existir: ter mãos e olhos num viver que é feito de alimentos e de lágrimas e do amar e amar e sofrer e sofrer. Como registra a figura da mãe, aquela mulher desabitada no cenário em desordem. Conclui, novamente a se dirigir a si mesmo ou a um interlocutor, que nada do mar bravio que levantou uma onda ficou na memória. A última estrofe do poema também de um só verso, determina: não tens mais lembranças do que a tua vida. Síntese de uma vivência de maturidade em que as lembranças afloram e são ordenadas para os textos em prosa, “Vidas del poeta” que escreve para O CRUZEIRO Internacional e para os poemas de Memorial de Isla Negra. Inventários de alegrias e angústias que o Poeta relata sem pejo porque sabe que falar de si é a melhor maneira de falar de todos.

Cecilia Zokner in Literatura do ContinenteO Estado do Paraná, Curitiba, 9 de julho de 2006



2 de julho de 2006

O Poeta perguntador: Vinte poemas de amor

            Numa entrevista, concedida a Rita Guibert, em janeiro de 1970, instado a falar sobre Veinte poemas de amor y una canción desesperada, Pablo Neruda lembra que, no prólogo da edição que festejava terem sido vendidos, desse livro, um milhão de exemplares, ele havia dito não entender a razão pela qual um livro de amor triste, de amor doloroso, continua sendo lido por tanta gente, por tanta gente jovem. Dois anos depois, a Editorial Losada comemorava os dois milhões de exemplares em espanhol, repartidos numa trintena de edições: um número surpreendente para um livro de versos que, pese a sua importância na obra nerudiana – críticos asseguram que esses poemas são o verdadeiro ponto de partida de sua poesia – não recebeu, ainda, a merecida atenção dos estudiosos de sua obra.

            Os poemas desse pequeno livro de Pablo Neruda foram escritos entre 1923 e 1924 e se inspiraram em duas ou três figuras femininas que ele se recusou, sempre, a nomear, embora, alguma vez, tenha prometido dar uma explicação sobre cada um desses poemas de amor. Na Conferência pronunciada na Universidade do Chile em 1954, quando, segundo Margarita Aguirre (Las vidas del poeta, Santiago, Zig-Zag, 1967), fala muito de si mesmo, ele argumenta que não levaria a nada citar nomes. Assim, nesses vinte poemas, elas se fundiram na figura de uma amada única. Em meio a cenários, povoados pela tempestade, pelo mar, pelo crepúsculo e, em meio a um mundo que se precisa num porto, num campo de espigas, num bosque, por vezes, num insinuado aspecto da cidade, a mulher se esboça. Tem o corpo de madrepérola ensolarado, braços de pedra transparente, mãos suaves como as uvas, voz de pássaro, cintura de nevoeiro, luminosos olhos, sorriso da água. Sua presença se oferece como guia (Marca meu caminho em teu arco de esperança), ente protetor (para sobreviver te forjei como uma arma, / como uma flecha no meu arco, / como uma pedra no meu estilingue), consolo (es tu[...] onde meus beijos andam e minha úmida ânsia se aninha), amante desejada (“Quero fazer contigo / o que a primavera faz com as cerejeiras). Junto dela, o Poeta se ancora em suas próprias ansiedades: na solidão, se depara com o inatingível (Só guardas trevas, fêmea distante e minha); na tristeza em que mergulha, busca preservá-la (para que entristecê-la). Ou, vibrante, se exibe na emoção de amar (Aqui te amo e em vão te oculta o horizonte) e de possuir (Fui marcando com cruzes de fogo / o atlas branco de teu corpo, Na rede de minha música estás presa, meu amor); e, melancólico, no desvanecer do amor (é tão curto o amor, e é tão longo o olvido).
            Um universo amoroso que acredita, afirma, proclama. Por vezes, interroga. Para reafirmar seu preito de amor: Quem escreve teu nome com letras de fumaça entre as estrelas do sul?; para indagar, da amada, uma ausência que, na verdade, está a se instalar nele mesmo (Quando chego no vértice mais atrevido e frio / meu coração se fecha como uma flor noturna.) Para constatar que a presença feminina é, para ele, estranha, alheia, sem valor, ao pretendê-la parte de objeto inanimado e perguntar-lhe o que era – vareta de um imenso leque – enquanto ele soçobra em meio ao sofrimento e à solidão. Para descobrir o desconhecido: Quem chama? que silêncio povoado de ecos? Para lamentar não ter estado com a amada, de mãos dadas, na hora do crepúsculo e com a alma apertada de tristeza, querendo saber, e lhe pergunta, onde estava, com quem.
            Das certezas de poetar e das suas indagações, se alimentam os enigmas líricos, eles próprios uma reposta que o Poeta perguntador, surpreso, desconhece: Por um milagre que eu não compreendo, este livro atormentado tem mostrado o caminho da felicidade a muitos seres.


Cecilia Zokner in Literatura do ContinenteO Estado do Paraná, Curitiba, 2 de julho de 2006

24 de abril de 2006

“El personaje de neruda se resiste a hacer una biografia tradicional”


El director de No acaba de terminar su película Neruda, una comedia negra sobre la persecución que sufrió el poeta en el gobierno de González Videla.
Rodrigo González M.

Pablo Larraín durante el rodaje de Neruda.
Foto: Fabula-Diego Araya
”Y usted, ¿cómo se llama? Si, usted”. El que habla es Pablo Neruda y así enfrenta a los policías en la nueva película de Pablo Larraín. Tiene orgullo, soltura y una pizca de ironía. En esta misma escena se ve a un policía de delgado bigote e inexpresivo rostro que mira al poeta. Es Oscar Peluchoneau, el detective que por orden de Gabriel González Videla debe capturar a Neruda, pero que aquí no lo hace. En este juego de cacerías y roles dislocados, puede pasar que el cazador se pase toda su vida buscando a una presa inasible. Es más, tal vez sea humillado y Neruda le pregunte cómo se llama.
Filmada entre Santiago, Valparaíso, el sur de Chile, Buenos Aires y París, Neruda tiene poco y nada que ver con lo que antes realizó Pablo Larraín y sí mucho en común con las artificios de la técnica cinematográficas, los laberintos de la novela negra y un costado poco conocido del poeta: su sentido del humor. Es aquella virtud la que lo mantiene vivo y la que lo hace escapar en el año 1948 a la persecución ordenada por Gabriel González Videla tras prohibir el Partido Comunista. El filme de Larraín, al que La Tercera tuvo acceso a parte del metraje, es además una construcción imaginaria sobre lo que pasó con Neruda ese año, permitiéndose las licencias creativas del caso.
Ela actor Mexicano Gael Gárcia Bernal
interpreta al policía Oscar Peluchoneau,
designado por González Videla para
hallar a Neruda.
En este retrato se despeina su retrato icónico a través de escenas nerviosas y tragicómicas: Neruda, personificado por Luis Gnecco, lee su Poema XX vestido de jeque árabe en una gran fiesta; el detective Peluchoneau (Gael García Bernal) pasa de largo frente a una vitrina donde el escritor se camufla entre fotografías; Neruda, consciente del aura mítica que le otorga la pesquisa, concluye: “Esto tiene que ser una cacería salvaje”.
Seleccionada para la Quincena de Realizadores del Festival de Cannes (del 11 al 22 de mayo), la película se estrena el 11 de agosto en Chile y su realizador, a medio camino entre la reciente edición de esta cinta y el montaje de la nueva Jackie (con Natalie Portman como Jacqueline Kennedy) se explaya.

Gael García Bernal decía que no sabía cómo iba a terminar su personaje y que sólo se definiría en la sala de montaje
Es que efectivamente pasa eso. Truffaut tenía una frase muy cierta: cuando uno filma lucha contra el guión y luego en la edición pelea contra el rodaje. Al principio a mí me costaba el proceso de montaje, pero hoy lo disfruto muchísimo. Creo que el momento más luminoso al hacer una película es cuando tienes todas las escenas frente a ti, te sientas y dices: “Ya, a ver que es esto”. Al final dimos con algo que nos transformó y fascinó. Pero esto les pasa a todos los cineastas.

¿Pero para ustedes era nuevo?
Es que todo es un juego de ilusiones al final. Estábamos filmando en pleno invierno con capas de plástico contra la lluvia y frente a nosotros había un set de los años 40 con actores con micrófonos bajo sus abrigos, jugando a una ilusión absolutamente arbitraria. Y a partir de eso se produce una sensación de destino desconocido que puede provocar angustia, placer o ambas cosas a la vez. Dentro de esas circunstancias llegamos finalmente a este biopic falso, entre otras cosas porque creo que el personaje de Neruda se resiste a un biopic normal. Simplemente no cabe en una caja para decir: “Ya, este es Neruda”. Sería una pretensión muy grande de mi parte. Es por eso que en general no me gustan las biografías fílmicas tradicionales. En esta película, en cambio, hay una arbitrariedad muy grande que al mismo tiempo te provoca un goce enorme: es pura libertad. Se trata de la figura del perseguidor y el perseguido que a su vez componen una suerte de muñeca rusa donde todos crean algo cada vez más falso, a su vez dentro de otra cosa, que está en otra. Por eso optamos por hacer la película como una fuga, un policial, dónde hay mucho de leyenda.

¿Cree que Neruda tendía o gustaba de la mistificación de sí mismo?
Hay una discusión histórica muy interesante al respecto: a Neruda lo buscaron 300 policías dirigidos por el comisario Oscar Peluchoneau durante más de dos años y nunca lo capturaron. Andaba prófugo, pero también hacía fiestas, iba a reuniones y circulaba por las calles. Se presta para pensar que aunque González Videla ordenó su detención, en algún momento prefirió que eso no sucediera pues tener preso a Neruda era impresentable. De ahí entonces nos viene la idea de un policía que tiene que perseguir a alguien, pero sin tener que atraparlo. Eso, en la película, nos sirve para entrar a la farsa, la comedia, el humor negro. Es un cóctel cinematográfico entre parodia y género policial,

¿Por qué se opta por un tono irónico?
Sucede que ellos vivían en un período modernista, con sueños gigantes e infinitos, mientras nosotros ya sabemos lo que pasó después. Lo que hacemos es ir a ese lugar y época, tratar de entender como pensaban, pero no olvidarnos que nosotros estamos con la ventaja del tiempo. Por eso, en vez de caer en la ingenuidad de hacer una película seria y grave donde los personajes se gritan sus ideas y viven todo con pasión extrema, preferimos meterlos en una fabricación lúdica e inasible.

En No ya estaba este espíritu y se prefería contar la historia que todos conocemos de otra forma
No se trata de sacralizar o sacralizar a nadie, sino que de construir un artefacto que sea fascinante y eso se hace con respeto, pero también con libertad. Ahora, No es un proyecto muy distinto a Neruda, escrito por Pedro Peirano, quien puede tener una forma muy diferente de ver las cosas que Guillermo Calderón en Neruda. Lo que yo hago es acomodar los guiones a a mi visión.

¿Por qué optó por una estética tan llamativa, muy diferente a la oscuridad de El club, Post Mórtem o Tony Manero?
Es una estética más luminosa y clásica, con muchos movimientos de cámara y una narrativa nos pareció adecuada para este relato. Es una película con más de 60 locaciones, con una producción larguísima que significó nunca estar más de dos días en un mismo lugar y en ese sentido nos pareció interesante darle un ritmo visual que fuera atrapante . Eso quizás tiene que ver con lo que nos produce la propia poesía de Neruda y, por supuesto, su vida peligrosa y fascinante. Es una persona que todo el tiempo se está poniendo en riesgo, que desafía al presidente de la época en el Congreso, que luego se escapa, que se sube a un caballo, se mete en una casa, después a otra, se esconde en un closet, se sube a una ventana, deja pistas, hace bromas, escribe. Creo que Neruda, a pesar de ser muy diferente a Nicanor Parra, tenía esa capacidad de descolocar. En algún momento uno no sabía si hablaba en serio o no.

¿Sí?
Cuando quería, podía hacerlo. Tenía las herramientas, la erudición, la sofisticación y la inteligencia para conversar con alguien sin saber si hablaba en serio o no. Ahí es cuando creo que Luis Gnecco es un genio a la hora de interpretarlo. Además, después de mucho tiempo, había logrado bajar de peso, pero a la hora de hacer Neruda tuve que pedirle que subiera 25 kilos.

¿Puede que los cercanos o estudiosos de Neruda no estén de acuerdo con la película?
En la Fundación Neruda leyeron el guión y lo aprobaron, pero no porque estén de acuerdo con todo, sino porque creen que su figura es patrimonio de todos.

¿Qué banda sonora tiene?
Gran parte de la música es del siglo XIX, música clásica de Edvard Grieg, Felix Mendelssohn o Antonin Dvorak. Pero también hay músicos del siglo XX como Krzysztof Penderecki o Charles Ives, Y, claro, composiciones de Carlos Cabezas.

¿Se siente muy cansado con tanto rodaje y compromiso en el cuerpo, sin parar: El Club, Neruda, Jackie, óperas, teatro?
No. Tengo para rato. Me van a tener que sacar a palos.

Arquivo Adriana, Latercera, Santiago, 24 de abril de 2006